sexta-feira, 25 de maio de 2012

Coisas várias.

Botardi!

A frequência dos meus posts diminuiu, mas a verdade é que a quantidade de trabalho aumenta e o tempo para estes pequenos devaneios diminui.
Estou agora de volta com alguns acontecimentos dos dias que passaram.

Na passada Quarta-Feira, dia 16, tivemos o prazer da visita de 2 jovens Portugueses. Qual a razão dessa visita? Essa é de morrer de inveja!
O Gonçalo, proveniente de uma pequena aldeia, de seu nome Carregal do Sal, em Viseu, decidiu um dia que iria dar uma conferência sobre o conceito Gap Year na Fundação Lapa do Lobo, fundação essa pertencente ao Dr.Carlos Torres.
Um dia o Gonçalo acordou com um telefonema deste mesmo senhor, perguntando-lhe se estaria interessado em fazer um Gap Year totalmente financiado, com a oportunidade de escolher os países que queria visitar.
O Gonçalo aceitou, escusado seria dizer, e pôde convidar um amigo, o Tiago.

Timor foi o 23º país que visitaram. Passo a enumerar a totalidade dos países: República Checa, Alemanha, Dinamarca, Noruega, Suécia, Finlândia, Estónia, Rússia, Ucrânia, Moldávia, Roménia, Bulgária, Turquia, Índia, Nepal, China, Laos, Cambodja, Tailândia, Malásia, Singapura, Indonésia, Timor, Austrália e Nova Zelândia.
Esta viagem ou o propósito do financiamento não é meramente turístico ou lúdico. Como os próprios dizem, eles interessam-se pelas diferentes realidades dos  distintos países, e, assim, transmitem-na para que mais pessoas tenham acesso à informação e às experiências por eles vividas. Eles querem incentivar mais pessoas a viajar, porque viajar é mais fácil e barato do que pensavam. (Eu partilho da mesma opinião!) A juntar a isto, o Gonçalo e o Tiago durante a viagem envolvem-se em projetos de voluntariado, como é o caso do MOVE, em Timor.
Estiveram cá a conhecer o trabalho que fazemos, assistiram às aulas que damos na Universidade , conheceram Dili e ainda houve tempo para um grandioso churrasco na casa MOVE.

O Churrasco já há tanto apalavrado.
Sexta-Feira foi então um dia agitado e animado.
A ideia de Churrasco ou BBQ parece sempre bem. Mas e o churrasco? E a grelha?
O nosso vizinho, um dos incontáveis que nos rodeiam, tinha uma espécie de churrasco, que eu arriscaria dizer que é ferrugem em forma de churrasco mas que, ainda assim, nos serviu muito bem. Compraram-se as grelhas, entrecosto, frango, chouriço, cervejas, batatas fritas, pão e mais cervejas. A mesa estava feita.




Montou-se o estaminé enquanto éramos atropelados pelas crianças que, como todos os dias, entram pela casa adentro como se donos da casa fossem. Como o churrasco aconteceu na parte exterior da casa, avisámos as crianças que por volta das 17h havia festa.
Qual é o nosso espanto quando as crianças vão aparecendo de banho tomado e com roupa de “missa”. A missa é a única ocasião em que o Timorense se veste a rigor, se arranja com cuidado, calça um sapato bonito, e põe perfume. Em situações normais, facto mais visível quando falamos de crianças, andam descalças, com roupa prática e muito suja.
Eis que Olívia aparece com uma vestido rosa de princesa; a Bakita com um vestido rosa mais discreto; a Avita desta vez penteada e com um vestido florido. Os meninos penteados com gel,  vestidos com um pólo, calça de ganga e sapato!


Estes miúdos vizinhos são pobres quando comparados com pobres em Portugal, claro. Mas, e falo com base no contacto permanente que tenho com eles nas redondezas de minha casa, eu diria que vivem bem, dentro do possível. Não passam fome, mas também não comem fartamente; têm roupas bonitas ainda que as usem raramente(compreensível, dadas as horas extensas de brincadeiras na terra, quando não lama).
Isto para explicar (ainda que pareça contradição), o violento e exagerado  ataque às primeiras batatas fritas que cuidadosamente e já na expetativa de que desaparecessem em poucos segundos, pusemos na mesa. A partir deste ataque às batatas, toda a comida que se punha na mesa tinha poucos segundos de exposição. Falo do frango no churrasco, do chouriço, da pasta de atum. Até que deslocámos a comida para dentro de casa, para que os convidados pudessem comer.
As crianças dançaram “ai se eu te pego” vezes sem conta, sempre como se fosse a primeira vez. Felizes da vida! 




Um episódio engraçado que não posso deixar de contar. As crianças sabem da existência de uma pessoa muito semelhante a mim, a Margarida. Sabem, porque lhes mostrei fotos e porque algumas até já falaram no skype com ela.
Durante o churrasco, caminhei até à Estrada principal do bairro para indicar a uma amiga a direção da casa. Entro no carro dela para depois seguir até minha casa. Saio do carro e vejo as crianças que, com um ar confuso, quase incrédulo, perguntam “Margarida???!!!” Não esperavam que voltasse no carro ou talvez nem me tenham visto a sair!

Findo o churrasco, depois de acabarmos com 5Kg de carne e cerca de 80 cervejas, a festa foi na GNR e durou até às tantas.

A semana que agora acaba foi de comemoração. Timor Leste fez 10 anos. Um dos países mais jovens deste mundo. Timor comemorou o 10º ano de independência.
Bandeiras de Timor Leste nos carros, nas motas, nas casas, nas lojas, nas barracas, nos quiosques, nos telhados. A bandeira Nacional de Timor Leste e o orgulho deste povo por todo o lado.
O Presidente Cavaco Silva visitou Timor Leste pela primeira vez. Mostrou-se surpreso com o estado de pobreza do país e apelou ao reforço do investimento português em Timor Leste.
Simpaticamente convidou a comunidade Portuguesa de Timor-Leste para uma festa ao estilo Português. Juntamente com  Cavaco veio a sua esposa e alguns ministros Portugueses, entre os quais, Paulo Portas que tive o prazer de cumprimentar.
Ouviram-se os Presidentes Cavaco e Matan Ruak. O novo presidente de Timor Leste, Taur Matan Ruak, declarou Português como língua oficial não materna leccionada como língua estrangeira, uma decisão feliz para Timor!
Cantou-se o fado pela voz de Kátia Guerreiro e comeu-se bacalhau com natas, rissóis, croquetes, pizza; bebeu-se vinho também (e que saudades que eu tinha de um bom vinho tinto!!).

Mudando de assunto.
Talvez vos esteja a dar uma novidade, mas aqui há “cabeleireiros” e “salões de beleza”. O conceito existe. Os malays frequentam e alguns timorenses ricos também.
Eu fui cortar o cabelo, por sinal bastante mais do que aquilo que eu queria!
Entrei no “salão”. Sala pequena com arrumos traseiros visíveis. Chão de tapete, do lado direito uma maca preta com uma almofada no sítio onde se coloca a cabeça. Uma bacia no chão e um balde. Champôs de supermercado. Do lado direito, 2 cadeiras com um espelho partido e enferrujado em frente. Nas paredes, algumas páginas de revistas coladas, com anúncios a produtos de beleza. Muitas referências hindus, oferendas na porta e dentro do salão.
Duas tailandesas, uma lava a cabeça a outra corta. Uma arranha a cabeça e a outra dá umas tesouradas.
Deitei-me na maca. Água fria (não esperava outra coisa) despejada de um balde para a cabeça. O balde enchia-se da bacia e de 2 em 2 viragens de água precisava de ir aos arrumos encher a bacia com água nova. Qual torneira.....lavou-me o cabelo e lavou a almofada também.
Sentei-me na cadeira para cortar as pontas...a verdade é que ela me cortou as pontas da maneira mais desengonçada que alguma vez vi. Em vez de 1 cm, foram uns 5...!
Tive pena de não ter levado máquina fotográfica mas hei-de lá voltar para registar.

Quanto ao trabalho, esse tem sido muito.
O Projeto UNTL- Projeto Liquiçá  de que já vos falei,  foi posto em prática. Temos uma turma de 7 alunos que, juntamente comigo e com o Francisco, trabalham para desenvolver a comunidade, mais especificamente otimizar a produção de kadiok (caranguejo), budu-tasi (algas) e agar-agas (doce de algas).
Os alunos são do curso de agronomia e agro-economia e são alunos muito interessados e bastante mais desenvolvidos intelectualmente do que os alunos que temos no nosso módulo de Gestão e Empreendedorismo. Isto deve-se ao facto de estes alunos terem sido escolhidos a dedo pelo responsável de departamento destes cursos.
Na próxima semana vai-se realizar um feira de produtos locais em Dili. O MOVE conseguiu um espaço na feira para as produtoras de doces de algas venderem!  Elas são 4, produzem apenas quando há feira em Liquiçá (talvez 1 vez por ano). Interessa dizer que estes doces são vendidos em supermercados, importados da Indonésia. Acontece com os doces, com os frangos do Brasil e com tantos outros produtos.
Achámos que esta seria uma boa oportunidade e queremos que, com isto, elas percebam que é fácil fazer dinheiro se houver trabalho. Porque se ser reactivo não chega, não reagir então, não é viável! É preciso proatividade que tanta falta faz a este povo….
Fomos com elas às compras e vamos emprestar o dinheiro necessário para que comprem os ingredientes necessários. Note-se que são apenas 15$, pois elas já possuem os equipamentos necessários. A verdade é que com este dinheiro conseguimos que elas começassem esta produção.
Estamos ansiosos pela feira, esperemos que corra tudo bem e que este acontecimento tenha sido uma pequena vitória nesta luta difícil que é despertar interesse pelo negócio, pelo trabalho, pela iniciativa, por uma vida melhor.

O Hugo e o Pedro, os 2 elementos do MOVE mais envolvidos na Cooperativa de Flores, estiveram esta semana em Los Palos a dar formação a Pescadores, no âmbito do conceito cooperativa, a pedido da Cooperativa de Flores.

Esta semana corrigi os testes dos alunos da UNTL. Agora entendo a desmotivação da minha querida mãe professora quando tem esta tarefa para fazer.
As aulas na UNTL têm seguido normalmente. Fizemos este teste a semana passada para ter algum feedback do nível de aprendizagem dos alunos e um inquérito para avaliar o nível de satisfação dos alunos em relação ao conteúdo das aulas, maneira como são lecionadas e idioma.
É muito difícil avaliar ou perceber se os alunos entendem a matéria. São raros os alunos que frequentaram todas as aulas desde o início, mesmo estes têm testes medíocres. Os que faltaram a algumas….imaginem!
O facto das aulas serem lecionadas em português vem dificultar bastante, porque a maioria dos alunos tem sérias dificuldades em expressar-se em português.
Já expliquei anteriormente que as aulas consistem no desenvolvimento de um plano de negócios de uma banca de fruta. A primeira parte do teste foi mais direcionada para conceitos e a segunda para o plano de negócios específico. Quando pergunto qual o produto de uma loja de telemóveis, muitos respondem fruta. É claramente um problema de interpretação.
Uma questão tinha dois grupos de imagens, um com um sumo e um caderno e outro com um táxi e um senhor que entrega correio. Pedia que escrevessem qual o grupo que correspondia ao conceito produto e qual o que correspondia ao conceito serviço. Metade escreveu o nome dos produtos e dos serviços que via na imagem.
Quanto à definição ou diferença entre produto e serviço, nenhum conseguiu explicar. Evidente que se o português deles fosse bom, não seria difícil perceber a diferença, mas a juntar à pouca capacidade intelectual, junta-se a dificuldade da língua…
Se falarmos em números, a situação complica-se. A literacia numérica não é de todo o forte do Timorense.
Fizemos um simples exercício: “O Mário trabalha 7 horas e a Mariana 7,5h. O Chico paga 10$/hora de trabalho. Qual é a despesa total do Chico?”. Cerca de metade respondeu bem, a outra metade errou, ou por não conseguirem raciocinar, ou simplesmente porque 14,5*10 = 1,45 ou 14,5. O multiplicar por 10 ou dividir por 10 também não é imediato, precisam de calculadora ou de “fazer à mão”.
Estes são alguns exemplos. É a realidade dos alunos finalistas da Universidade. Não quis ser destrutiva, é simplesmente a constatação de um facto. Facto este que espero que mude, pois é para isso que aqui estamos!

Esta semana fomos convidados para a cerimónia de entrega de diplomas aos estagiários (na área de manutenção dos ares condicionados) da GNR. O Mário e o Francisco foram representar o MOVE, que colabora com o ministério da Economia no projeto da Incubadora de empresas, para onde os estagiários irão.
O Ministro da Economia de Timor Leste agradeceu a colaboração do MOVE, que na realidade ainda não começou, mas estamos a trabalhar nesse sentido.

Estes foram alguns episódios da semana.

Amanhã às 6 horas da manhã estamos a ir em direção ao Ramelau, a montanha mais alta de Timor Leste, conhecida pelo espetacular nascer do sol. Um fim-de-semana diferente, longe da confusão de Dili!

Uma das atividades do jardim de infância MOVE, pintar!


Festa Africana no Arbiru. Haja...alegria?

Beijinhos a todos e bom fim-de-semana!
MM


1 comentário:

  1. Ler o teu blog, o trabalho e as experiências que têm, bem como as maravilhosas fotografias que se conseguem nesses ambientes é, no mínimo, inspirador. :)

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