quarta-feira, 28 de março de 2012

Desta vez nada teve a ver com preguiça ou falta de inspiração. Deveu-se a falta de tempo. Ainda bem,
já que na semana passada pouco se fez.
Fui, na passada Quarta-Feira, visitar o distrito do Remexio com o Sr. António do CJPAV. Chegar ao Remexio leva 3h, por caminhos irregulares, montanhas desniveladas, espaços estreitos, lama e muitas pedras.

Mais uma visita para constatar o já constatado: empreendedores que não merecem o nome técnico que lhes é dado.
O Sr. Armando pediu, em 2010, 500$ emprestados para investir num quiosque, diz ele. No meu juízo, o dinheiro talvez tenha servido para fazer uma casa e, quem sabe, comprar umas galinhas/ovos/porcos para venda posterior. Não mais do que isto. Este senhor já regista no histórico algumas fugas quando se lhe pede dinheiro. Desta vez o Sr. Antoninho, ao chegarmos a casa do Sr. Armando diz: “fiquem nessa porta das traseiras, eu vou pela frente”. Não houve maneira de escapar, apesar de ele ainda ter tentado o quarto. Quarto esse que, se eventualmente não fosse separado por uma Cortina, a fuga talvez tivesse resultado.
Posto isto, o Sr. Armando sentou-se atrapalhado, engasgado e sem dinheiro.
Até então, esta teria sido a casa mais humilde que tinha visto. Quase todas tinham o mesmo aspecto exterior, construídas em bamboo: bamboo direito ou entrelaçado; e telhado feito com folhas de palmeira empilhadas. Chão que resulta da extracção da terra do solo até chegar à pedra, ainda com restos de terra. “Paredes” escassamente enfeitadas por desenhos de uma criança e um jornal aberto. O quarto é designado assim, pois é um sitio onde se dorme, mas dentro desta única divisão da casa, apesar de não ter conseguido ver na perfeição, a cama não existia. Dormem com esteiras no chão.

Aproveitámos o contacto da Madre Mª do Céu, fornecido pelo embaixador e dado como um bom contacto para nos ajudar a identificar comunidades responsáveis e merecedoras de microcrédito, para prolongar a estadia no Remexio.  

Almoçámos na casa das madres. Não sei se já expliquei anteriormente, mas as madres e os padres são o elo de ligação entre as instituições de microcrédito e os empreendedores. São, na maior parte, Portuguesas e vêm para Timor para ajudar. Ajudam as crianças, ensinam e inventam actividades para dar emprego a pessoas e pagar um valor simbólico. Estas madres faziam crocodilos de tecido e algodão, toalhas de mesa e outros acessórios que vão inventando. No Remexio existem 3 madres todas “bem porreiras”. Antes do almoço rezaram, cantaram, benzeram-se e só depois comeram, enquanto eu assistia estática e cabisbaixa. No final da refeição, a mesma história.
As madres plantam todo o tipo de frutos que possam imaginar, no espaço verde que rodeia o centro onde trabalham. Maracujás, bananas, papaias, goiabas, chá príncipe, cenouras,… Ofereceram-nos 1 saco gigante de maracujás.
 Às 14h era hora das crianças chegarem ao centro. Brincam, vêm filmes, aprendem português, entre outras actividades. Brincámos com elas e assistimos a uma aula. Há muita organização e disciplina. Antes da aula começar fazem uma oração, de seguida cantam uma música à escolha e prosseguem a aula, cada um no seu lugar marcado.

Voltámos para Dili no meio de transporte dos timorenses. Digo isto porque os malai têm carro, não andam ali. Nós andámos e andamos. É uma carrinha de caixa aberta, com cerca de 20 timorenses + 2 malais, eu e o Chico. Para eles é estranho, gozam connosco, riem-se, comentam e metem-se connosco de uma forma indirecta. Acham estranho.


Sábado fomos para Ataúro numa viagem que combinou trabalho e lazer. Ataúro é uma ilha que pertence a Timor, mais precisamente, é um sub-distrito de Díli. Situa-se a Norte de Dili, cerca de 25km.
A ilha é dividida em cinco distritos/sucos: Bikeli, Beloi, Macadade, Makili e Vila, sendo a Vila considerada a Capital de Ataúro.
Ataúro fica a 2h30 de barco de Dili. Depende do barco, claro. Este que vêem na foto é o Nakroma que funciona apenas ao Sábado.



É uma ilha que apresenta uma beleza natural inacreditável. Não há foto que a transpareça.  Uma vista paradisíaca. Uma mistura de verdes e azuis fazem desta ilha uma das paisagens mais bonitas que tive o prazer de ver.
Já as condições em que as pessoas de vivem ficam para lá de miseráveis, não tenho adjectivo para descrever. Não tenho adjectivo, nem existe qualquer combinação de palavras que vos faça perceber esta realidade.






Vila e Beloi são os únicos 2 distritos que possuem electricidade. Das 18h às 00h, dia sim dia não. Alterna entre estes dois distritos.Toda a restante ilha não tem.
Apenas estes 2 distritos são servidos de água, das 6h às 9h e das 16h às 19h. Nas horas em que há água, deixa-se que ela encha baldes e tanques para mais tarde ser utilizada. O banho é tomado de balde, e assim o fizemos nós. Água suja, muito pouco agradável, mas ainda assim, água.

Os distritos que não possuem água, aproveitam a água da chuva (que guardam em tanques). É a água que bebem. Para outros fins têm um poço de água do mar, salgada.

Existem nascentes de água potável, muito poucas e localizadas em sítios de difícil acesso. Todos os sítios são de difícil acesso.
                                
                                         Nascente
Há apenas uma Estrada aceitável em Ataúro, que liga Beloi à Vila.
Todas as restantes, falemos de carros, motas ou camiões, não há meio de transporte que consiga circular. As pernas são o meio.

O solo de Atauro faz crescer milho e muito poucos outros alimentos. É de milho que se alimentam. É o milho que os alimenta. É o milho que os salva.  Como o milho não dá os nutrientes necessários, há ainda uma árvores cujas folhas possuem diversas vitaminas, e por isso também as comem. Quem tem arroz, mistura com arroz.
Para adiar a fome, mastigam uma pastilha vermelha. Serve para confortar o estômago e deixa muita tinta vermelha na boca. Por isso é comum ver as pessoas com os lábios pintados de vermelho carregado.
Para fazer chegar qualquer tipo de bem que possam imaginar ao cimo de uma montanha é necessário transportá-lo a pé. Sejam 3h ou 4h. Sejam crianças ou adultos. Ao sol, descalços, por cima de pedras instáveis e desconfortáveis, terrenos inclinados e quilos de carga.  Falo porque o fiz, com a diferença de que o fiz calçada, de barriga cheia e sem carga.

Reparem no peso que levam e imaginem as horas de caminhada.

Padre Luis com Senhor 
Fomos com o Padre Luis a Makili. Makili prolonga-se da montanha ao mar.
Caminhámos das 14h às 18h30, hora em que apanhámos o barco para regressar. Subimos e descemos uma montanha,  em conversa e parando frequentemente ,tanto para cumprimentar as pessoas que passavam, conhecidas do Padre Luís que já cá está há 6 anos, como para acompanhar o ritmo do padre, que já apresenta alguma idade para tal esforço. Não havendo outra maneira de alcançar a parte mais elevada de Makili, andar é a única solução e o padre faz este caminho cerca de 4 vezes por semana. O intuito é visitar as diversas famílias, perguntar como vão, dar uma palavra de apoio. O padre acompanha também um projecto novo, que é o de construir casas de banho para a população e garantir que estes as usam.  Têm já uma casa de banho modelo. Isto, para incentivar o cuidado com a higiene e garantir mínimas condições.
Tivemos oportunidade de entrar em algumas casas, ver como “sobrevivem”.  Ver também as diversas e rudimentares engenhocas que constroem para fazer face às adversidades que encontram. "A necessidade aguça o engenho".
A comida que têm é armazenada numa casa construída no cimo duma árvore para os animais não a comerem. No tronco da árvore pregam uma placa de metal para os ratos não subirem.


Berço de bebé feito de bambo
Casa que recolhe comida
A faixa de metal para os ratos não subirem


Restos de bombas que os indonésios deixaram, servem agora de sinos.

Talvez não estejam a imaginar o cenário, ou talvez estejam. Imaginem-se no meio de uma floresta densa, imaginem que essa floresta tem palmeiras, eucaliptos, bananeiras, coqueiros e toda uma variedade de árvores cujo nome desconheço. As “casas” dispõem-se, nesta “floresta”, aleatoriamente”, sem qualquer critério. Vivem como se acampassem todos os dias.  Ainda não me parece uma boa descrição, mas fica a sugestão.
As casas são todas feitas de bambo e de folha de palmeira. A cozinha e a casa de banho são normalmente construções separadas do sítio onde dormem. Mais uma vez, dormem no chão.
A casa de banho, custa-me até usar este nome, é um quadrado de bambo com um tecido a fazer de porta. Tomam banho no máximo 1 vez/semana, penso eu. As necessidades fazem nos meio do mato. A água existe quando a vão buscar à nascente, em baldes. É bastante notável,utilizando todo um conjunto de sensações, a falta de higiene destas pessoas.
Aqui ficam algumas foto desta casa que vos descrevi. Os pequenos das fotos são os filhos do senhor. Por enquanto pareceram-me ser 6, mas é certo que estas crianças hão-de ter mais irmãos. Não há meios contraceptivos. Nascem aos 7, aos 8, aos 11, aos  15, nascem os que tiverem que nascer. Morrem também os que tiverem de morrer. Quase sempre morre algum filho, com falta de nutrientes ou com outro tipo de doenças.

"Casa de banho"
Cozinha 



Numa outra casa que visitámos, comemorava-se o aniversário da morte de um familiar. É uma forma peculiar de o fazer. Na cultura deles, festeja-se durante alguns dias, não sei precisar mas acredito que não passe dos 3 dias. Muita comida e toda a família reunida. Toda a família mesmo. Não há funeral enquanto não estiver a família toda reunida, nem que passe 1 semana até tal acontecer.
Dependendo do parentesco que o familiar tem ao morto, oferecem-se diferentes animais. Se for determinado parentesco oferece um porco, se for outro, uma vaca, um búfalo, um cavalo, uma galinha, vinho, dinheiro, o que for. Dê por onde der, custe o que custar. Mesmo. Em regra todos têm um animal para este fim. Quer tenham de passar fome durante dias,  quer gastem o dinheiro proveniente do microcrédito. Tudo vale para cumprirem a tradição.
É tal o investimento feito num acontecimento destes que esta é , muito frequentemente, a razão pela qual as pessoas não conseguem pagar o empréstimo.
A família que comemorava o aniversário da morte

É um povo extremamente católico, mas a cultura tem ainda mais força. É em vão o padre na missa pedir para que eles diminuam a importância que dão a esta tradição, que os empobrece e os endivida cada vez mais. É tradição. Dificilmente vai mudar. Mais uma contradição.

Uns descansam no sofá, outros em cima de uma árvore
A esperança média de vida chega aos 50 anos. Não passam desta idade, no geral. Fácil de perceber porquê. É uma vida de grande esforço e sacrifício e não há qualquer tipo de cuidados de saúde, médicos ou enfermeiros. È uma luta difícil numa ilha tão bonita e tão cheia de adversidades.
           
Vive-se num nível tão inferior ao limiar da pobreza que as pessoas se acomodam. Desconhecem outra forma de vida. Não sonham. Não sabem que se pode viver.
Desconhecia tal forma de se viver, talvez imaginasse, mas estava muito longe da realidade. É difícil encarar. 
O emprego delas é sobreviver, não ganham dinheiro. Parece-me que muitas delas não têm dinheiro sequer. Para além de sobreviverem, nada fazem. Todos caem na mesma rotina, fazer nada.
À medida que se desce a montanha vêem-se casas melhores, mais organização , mais luz, mais espaço. Aqui vive-se ligeiramente melhor, a proximidade do mar facilita o acesso ao exterior e consequentemente as oportunidades.


                                                                    

O olhar das pessoas, esse é sempre o mesmo. Curioso, com gargalhadas de vergonha e espanto. Juntam-se para nos observar e riem-se quando lhes dizemos “botardi”.


Segunda-Feira fomos visitar o Chefe de Suco de Biqueli. Fomos tentar perceber quais as maiores necessidades dos pescadores do distrito. Foi-nos apontada como maior necessidade, o gelo para conservar o peixe. Mas é complicado fazer gelo sem electricidade e sem água. Problemas sem fim!
Nesta viagem de trabalho, aproveitámos para passar pela praia mais bonita de Ataúro, Acrema.
Acrema
Fomos também numa viagem longa até Macadade, debaixo do sol forte e por caminhos que pensava impossíveis de passar, neste camião da foto. Daqui resultaram 2 calos nas mãos (pela força que fiz nestas 3h para não cair ou rebolar do camião) ; e um escaldão geral, para variar.
Ainda não sabia o que me esperava!

O quarto
Na primeira e na última noite ficámos num quarto da biblioteca do Padre Chico. Um quarto com uma cama. Eles ficaram os 4 no chão, com umas esteiras e eu na cama, claro. A biblioteca tinha um espaço com 4 casas de banho, cada uma delas com 1 buraco no chão e um tanque de água. Tomar banho às 20h significa tomar banho à luz de uma vela e com água estagnada e suja. O ambiente é desagradável, nunca sabemos se a comichão na perna é da água a escorrer, se é da barata, da melga, da aranha, ou meramente psicológico. Por isso sacudo sempre antes de ver. Não vá desencantar uma barata, como já aconteceu.

Na segunda noite ficámos num quarto da cooperativa, este com camas, colchão, lençóis e uma casa de banho com sanita e balde para tomar banho. Era como se estivesse num hotel de 5 estrelas.
Já na ultima noite voltámos para o quarto da biblioteca, porque esgotámos o nosso “plafond” e como devem calcular, não há ATM’s em Ataúro.
As refeições foram todas feitas no mesmo sítio, numa cooperativa dos Padres que existe na Vila. É considerado o melhor restaurante Italiano de Timor. Não existem mais restaurantes ou coisas do género. Esta é mesmo a única opção, tirando um quiosque que vende Coca-colas e doces, mas isto, mais uma vez, só na Vila, considerada a capital de Ataúro.

Acordámos às 2h30 da manhã para apanhar o barco de volta para Díli. A viagem tem de ser feita antes das 5 da manhã, antes da maré subir . Foram 3 horas de viagem num barco de madeira, com aspecto frágil mas ainda assim melhor do que muitos barcos que atravessam este mar.
Fazer esta viagem de barco em plena noite cerrada, sentir a brisa morna e ver o céu repleto de estrelas, sem qualquer luz a incomodá-las, é INACREDITÀVEL e inspirador. Estrelas cadentes de 5 em 5 minutos faziam-nos companhia.

Chegámos cansados a casa, por volta das 6h30 da manhã a precisar de um banho e de uma cama.
Às 14h da tarde demos a nossa primeira aula na UNTL. Temos 3 turmas com cerca de 20 pessoas cada. O módulo, como já referi anteriormente, é de gestão e empreendedorismo.

Damos aulas a alunos finalistas. Têm entre 21 a 27 anos e um raciocínio muito pouco desenvolvido. É verdade que não falam a mesma língua que nós(deveriam), o que dificulta muito o entendimento. Nesta primeira aula distribuímos uma ficha para preencherem dados sobre cada um, para percebermos o “background” deles e uma ficha diagnóstico, para avaliarmos o raciocínio e a capacidade de elaboração de uma pergunta.
Há alunos muito interessados, com muita vontade de aprender não só o conteúdo do módulo, mas também a língua Portuguesa.
É rara a pessoa que tem email ou que tem internet. Explicamos cerca de 20 vezes a mesma pergunta, tudo muito devagar, utilizando gestos e um vocabulário muito básico. O plano das aulas será aprender a desenvolver um plano de negócios. Queremos que eles tenham uma ideia de um negócio e vamos ajudá-los a desenvolverem-na. Queremos que resulte, vamos fazer por isso.
Num próximo “post” faço um “best of” de respostas para vos mostrar, visto que este já vai longo.

Amanhã começam as nossas férias da Páscoa. Bali, Lombok e Gili.
O blog tira férias também.

Boa Páscoa! ;)
MM

terça-feira, 20 de março de 2012

Boa tarde para esses lados longínquos,

Após alguma resistência decidi escrever. É minha intenção escrever semanalmente, o que pode não acontecer algumas vezes, ou por preguiça, ou por falta de inspiração ou por falta de tempo. Desta vez o post vai atrasado devido às minhas primeiras duas "desculpas".

Avita e Olivia, as vizinhas.
Esta semana que passou foi uma semana pouco ou nada produtiva. Habitualmente se não depender de nós, a semana já não é muito produtiva, com eleições pelo meio então aí Timor pára. Assim foi.
Timor pára por várias razões. Pára devido à importância natural desta data. Pára porque em Dili se concentra grande parte da população de Timor, pessoas que saíram dos distritos vizinhos e neste dia regressam para votar. Aqui não se pega no carro e espera-se demorar 2 horas numa distância de 200 km. Aqui apanha-se uma "biscota", carrinha de caixa aberta e vai tudo ao molhe na caixa aberta com destino aos distritos, preparados para viagens intermináveis pelas estradas que não merecem a denominação.
Tudo o que tínhamos programado para a semana que passou não aconteceu; no dia anterior, à última da hora ou mesmo em cima do acontecimento os compromissos deixavam de o ser.

Nunca vos falei da história de Timor e agora é um bom pretexto para o fazer, não fosse este Sábado que passou um dia histórico.
Timor-Leste foi, até 1975, uma colónia Portuguesa. Nesse ano, e após 3 dias da sua independência, foi invadido pela Indonésia dando início a 24 anos de conflito. A ocupação militar Indonésia fez com que Timor-Leste se tornasse a 27ª província Indonésia, chamada "Timor Timur". Durante estes 24 anos o território permaneceu considerado oficialmente pelas Nações Unidas, como território português por descolonizar. Estes foram anos de massacre sob uma política de genocídio. Alguns de nós ainda nos lembramos de ver na televisão imagens do massacre no cemitério de Santa Cruz, que aconteceu enquanto se homenageava um estudante morto pela repressão. O conflito destes 24 anos deixou quase 200 mil mortos, ou seja, quase um quarto da população Timorense na época.
Em 1999 os governos de Portugal e Indonésia começaram a negociar a realização de um referendo sobre a independência do território, sob a supervisão de uma missão da ONU. No dia 30 de Agosto desse ano os Timorenses foram votar e constatou-se que cerca de 80% queria a independência. Após este "acto de rebeldia" por parte dos Timorenses, o exército Indonésio desencadeou uma nova onda de violência, mesmo antes da proclamação dos resultados. Mataram nas ruas todas as pessoas suspeitas de terem votado pela independência.
Em 2001, os Timorenses votaram para escolher o novo líder do país, Xanana Gusmão. Foi em 2002 que Timor-Leste se tornou totalmente independente.
A ONU decidiu criar uma força internacional para intervir neste país que se apresentava totalmente incendiado e devastado.
Recentemente a ONU anunciou a retirada dos seus solados no fim deste ano, o mesmo será feito pelas forças australianas que vieram também para ajudar.
Timor-Leste vive pacificamente. O problema agora não é a guerra ou os conflitos, é sim a pobreza, a miséria e tudo o que advém deste estado de carência.
Este Sábado que passou foi a terceira vez que Timor-Leste votou para as presidenciais, passados 10 anos da independência. Foi por isso um dia importante e algo receado mas que passou sem incidentes, ao contrário do que se verificou em 2007, data em que Ramos Horta sucedeu a Xanana Gusmão. Ramos Horta teve até estas eleições a exercer o cargo de Presidente.
Sábado, 12 candidatos à presidência estavam em competição. Seriam 13 se Francisco Xavier do Amaral não tivesse falecido há poucos dias. Como nenhum dos candidatos reuniu mais de 50% dos votos, em Abril realizar-se-á uma segunda volta agora apenas com os 2 candidatos que reuniram mais votos, Francisco Lu Olo e Taur Matan Ruak.
Mais dias de improdutividade virão, podemos assim concluir.

Timor é dos países que mais dificuldade está a ter em atenuar a pobreza. Isto vem a propósito dos Millennium Development Goals. Os MDGs são 8 medidas que todos os 193 países membros das ONU e algumas organizações internacionais concordaram em combater até ao ano 2015.
Metade da população timorense vive abaixo do limiar da pobreza para as necessidades básicas, ou seja, vive com cerca de 0.66€ por pessoa por dia. Em 2007, 50% das crianças com menos de 5 anos de idade, tinha peso insuficiente. A longo prazo, o baixo nível de nutrição nos primeiros anos de vida terá impacto no desenvolvimento físico e mental, tendo como consequência, no futuro, recursos humanos de baixa qualidade para o país.

É com arroz que se alimenta a maioria dos timorenses. Ou arroz com arroz. Ou arroz com carne de búfalo. Ou arroz com vegetais. Por aí.
Sempre que estou a cozinhar, na cozinha que fica nas traseiras de nossa casa e dá para casa dos vizinhos, a Bakita entra pela cozinha com o seu ar misterioso a espreitar para o tacho. Desta vez a Bakita chamou o Paulo para ver. Eu cozinhava o mesmo de sempre, massa com carne. Especialmente desta vez, porque a Bakita chamou o Paulo, apercebi-me do quão estranho para eles são as nossas refeições. Substituía estranho por curioso ou apetitoso. Pergunto sempre se ela quer comer, ao que ela sempre me responde: não; ou com gestos ou com uma fala baixa e envergonhada.
Eles fazem o mesmo. Sempre que, ao jantar, os vemos com a sua panela de arroz pousada na mesa da entrada de casa, perguntam-nos se somos servidos. Oferecem sempre.
Ainda esta semana vamos fazer um lanche aqui em casa. Estamos com alguma dificuldade para conciliar os horários da família toda, mas vamos tentar.

Ontem deitei um tacho para o lixo, porque o estraguei. Já é um pormenor explicar o porquê de o ter estragado, mas quem me conhece sabe que a probabilidade de eu me ter esquecido dele ao lume é algo elevada. Foi exactamente isso que aconteceu. O tacho queimou e ficou inutilizável. A mana Nuni pergunta-me se o pode levar para casa, tentei explicar-lhe que o tacho estava queimado e deixava a água com uma cor estranha e que talvez não devesse ser saudável para cozinhar. Resultado desta explicação: zero, niqueles, patavina percebeu ela. Disse que sim e saiu com o tacho. Espero que corra tudo bem. 

Todos estes pequenos e aleatórios acontecimentos que vou constatando, constato-os porque na verdade me marcaram de alguma maneira. Todos me fazem pensar e chegar sempre ao mesmo género de pensamento. É incrível a sinceridade e a simplicidade destas pessoas. É incrível a ingenuidade e a pureza. É incrível a maneira como as crianças soltam uma gargalhada sempre que lhes mostro uma fotografia delas. Riem-se sem parar e pedem para ver outra vez. É incrível tudo isto quando combinado com um povo que vive, na sua maioria, abaixo do limiar de pobreza.
Fazem-me também pensar que muitos de nós, eu própria, nos esquecemos da sorte que temos por termos nascido num ambiente pacífico e com acesso a todo o tipo de bens. A verdade é que só reflectimos sobre estes assuntos quando nos deparamos com uma realidade como esta a que assisto todos os dias. 

Deixando-me de pensamentos. 
Esta Sexta-Feira fizemos um jantar aqui em casa e depois fomos sair. Enquanto estávamos num bar na marginal, o Cast Way, pela 1h da manhã, começa a chover repentinamente e levanta-se uma ventania tal que o bar parou para assistir a este momento enquanto eu pensava nos vários cenários que se podiam seguir. Foram 2 minutos de susto, em que até a água do mar nos salpicou, num bar que fica relativamente longe da linha do mar e a uma altura considerável. A chuva continuou mas todo o aparato envolvente parou e a noite seguiu como de costume.

Este quadro em baixo é a nossa recente aquisição. Utilizamo-lo para ir aprendendo tétum e para calendarizar as nossas tarefas como MOVE. A árvore genealógica que vêem no quadro é a da família que vive atrás da nossa casa. Fizemos para perceber qual o grau de parentesco das pessoas que nela vivem. As pessoas a vermelho são as que nós conhecemos. A vermelho só não vivem nesta casa os senhorios: a Teresinha e o Tony. Imaginem a confusão! Mas não acontece só nesta família, é cultural e consequência do estado de pobreza viverem todos juntos e "misturados" na mesma casa. 






Nós, malai, a jogar ao berlinde em frente a casa.






Mudei de ideias e vou aproveitar a Páscoa, não para viajar em Timor, mas para ir a Bali, Lombok e Ilhas Gili, viagem que vai ser repetida quando a mana chegar. Tempo nenhum me parece ser demais.

Beijinhos para todos,
MM

terça-feira, 13 de março de 2012

Em Timor a distância não se mede em Kms, mede-se em horas. 2h10 é a distância Dili-Bazartete. Os Kms são 50.
Bazartete fica no cimo de uma montanha. Pela primeira vez senti um frio natural, pois do A/C estou farta de sentir. À medida que subíamos ficávamos cada vez mais perto das nuvens, é mesmo a sério, as nuvens instalam-se num nível tão baixo que parece que tocamos nelas, nós ficamos mesmo entre elas. É bem visível nesta imagem a proximidade destas nuvens/nevoeiro à superfície.



Fomos visitar os empreendedores com o Sr.António do Centro Juvenil. Visitar sem aviso prévio, caso contrário muitos fugiriam, Sem avisar é quase certo que se encontram as pessoas. O objectivo desta visita foi: receber prestações e, porque nós estávamos lá, o objectivo foi também perceber qual o negócio que estava em questão e o ponto de situação do mesmo.
Bazartete
Foi dado crédito no valor de 500 Dólares a um grupo de 9 empreendedores em 2010. 2 anos já vão. O empréstimo seria para liquidar no prazo de 1 ano, mas como se o empreendedor demorar 2 anos não tem de pagar mais, adiar é a melhor solução. Adiar, adiar…até mesmo o CJ desistir do dinheiro e dá-lo como perdido. Só faz isto quem não precisa dele. É assim que funciona o microcrédito em Timor. Num país que precisa de motivação, de incentivos e de motivos para fazer melhor, as instituições dão crédito aos “empreendedores” sem o esperarem de volta.
Assim, é justificável a falta de produtividade, de visão, de ambição. A falta de verdadeiros empreendedores.
A Roberta é uma “empreendedora” que pertence ao grupo que mencionei. O objectivo da concessão do crédito foi, inicialmente, começar o negócio de um quiosque. Um quiosque aqui vende tabaco, refrigerantes, snacks, doces, etc. Pode ser numa barraca ou num espaço fechado. Para haver negócio, é preciso saber negociar, saber gerir, saber vender, enfim..saber contar. Não compliquemos.
Quiosque é igual a falhanço. Isto, nas montanhas, pois em Dili há quem tenha sucesso. Como o quiosque é um falhanço, nas montanhas as mulheres vendem pisangori (banana frita) às crianças da escola, que compram cada fatia por 5 Centavos.
Quisoque
Voltando à Roberta, que não é excepção e também ela produz e vende pisangori. A Roberta diz que não tem dinheiro para pagar e pela vontade do Sr.António a visita acabava ali. Eu quis ir um bocado mais longe e perceber o porquê de ela não ter dinheiro. Perguntei que negócio tinha ela, ela diz que tinha o quiosque que fechou há uns meses(nem o Sr. António sabia). Assim, mudou-se para o negócio de produção de pisangori, que, se a família não tiver que comer ou se tiver chovido e a lenha estiver molhada, não há venda nem produção, respetivamente. Como atualmente estamos na época molhada, ela não produz. Eu, espantada, sugiro que ela guarde alguma lenha de reserva em casa, para não ter de parar a produção. Reação: “ “. Ficamos sempre sem perceber se entenderam. Um sorriso ou um sim são normalmente as respostas deles.

Perguntei o que leva um fatia de pisangori, para quantas fatias dá uma banana, quanto custa um cacho de bananas, o óleo, o açúcar, a farinha...enfim, uma infinidade de perguntas para conseguir perceber o porquê do dinheiro não existir. Contas feitas, mais tarde em excel, concluo que a Roberta tem prejuízo por cada fatia que vende. Conclusão: ou a Roberta me mentiu no preço dos produtos que compra, para conseguir justificar a falta de dinheiro, ou então apercebeu-se da “balda” que é o conceito microcrédito em Timor.
Ainda assim, voltaremos brevemente a Bazartete para ajudar não só a Roberta como todos os outros empreendedores que ficaram por visitar, porque o Sr. António estava com pressa para almoçar.
Não é meu objetivo criticar sem fundamento. Eu critico inocentemente, sem aprofundar. É a minha opinião.
É claro que tudo provém de uma questão inicial fundamental: ajudar. Mas não se está a ajudar da melhor maneira. Tanto se quer ajudar, que se “desajuda”. 

Algo que me tenho vindo a aperceber em relação às pobres crianças Timorenses. Disse pobres. A carência delas é só material, com material entenda-se carência de alimentação, vestuário, alojamento, cuidados de saúde. Talvez seja por isto que é tão fácil conseguir um sorriso de uma criança.
Num mês e poucos dias em Timor não vi uma única criança, e acreditem que Timor tem muitas, a chorar ou a preparar-se para um birra, o que seja. Vejo-as sempre felizes, seja a brincar ao berlinde, seja a correr descalças na rua, seja sentadas num tronco deitado de uma árvore, seja ao colo da mãe, seja a vender crocodilos de Madeira, bolas, fruta, chapéus, pulsas..
Acontece com as crianças mas acontece também com os Timorenses em geral. São felizes assim. Sim, esta é a história do costume: “eles não têm nada e são muito felizes”. É facto, são mesmo, não é “treta”! São felizes.
Da mesma maneira que me apercebi do facto anterior ao me parecer ver um menino a chorar, apercebi-me também que os bebés não usam fraldas! Claro! Mas estas são as questões básicas que só pensamos nelas quando nos deparamos com alguma situação explicita. Desta vez, a Roberta, sentada numa cadeira, tinha o filho no colo. Sem aviso, o filho faz xixi não só pelas suas pernas abaixo como também pelas da mãe que, descontraidamente e sem expressão abre as suas pernas para que o xixi escorresse para o chão. Tudo volta à normalidade quando o filho acaba de fazer xixi. Foi um momento de pura elucidação.

Filomena Claudina
Também durante esta semana visitámos Bidau Santana, uma “aldeia” situada aqui em Díli. O propósito da visita foi novamente recolher dinheiro. Desta vez conhecemos uma mulher, a Filomena Claudina, empreendedora no verdadeiro sentido da palavra: tem um quiosque, que funciona bem, e dá aulas de Português. A casa dela está em construção, ou melhor, por construir. Esta mulher teve 15 vezes grávida. Disse-nos que 2 filhos morreram e outros dois não chegaram a nascer. Pagou a prestação que era suposto pagar e como ficou com peso na consciência, disse ela, mal tiver a última prestação para pagar, assim o fará. 

Filomena e netos

Casa de Filomena
Faz parte da cultura Timorense trazerem cadeiras para nos sentarmos ou dizerem para nos sentarmos num sofá assim que chegamos a casa de um. Podemos estar 1 minuto sentados, mas sentamo-nos para eles se sentirem respeitados.

Andar de Bicicleta tem sido cada vez mais prazeroso. Já não “paníco”.  O trânsito continua igual mas eu já me habituei a andar pelo meio dos carros, motas, carrinhas e camiões; por baixo deste calor imenso e da chuva que nos finta e nos molha sem aviso, e por entre esta pressão atmosférica sempre no auge. 

Casa de empreendedor que vendia animais e na visita não estava em casa, só a familia.

Sexta-feira tivemos conhecimento da existência de uma festa de música Portuguesa com jantar incluído na GNR. Conseguimos convites, graças a um contacto na GNR, e lá fomos nós todos pomposos para esta inesperada festa onde se encontrava o Presidente da República, Ramos Horta, entre a elite Portuguesa e Timorense.
Há 1 mês a comer massa, arroz e frango. Não queiram saber como me soube bem comer um bacalhau cozido com batatas e broa, seguido de várias e deliciosas sobremesas, cuidadosamente dispostas sobre as várias mesas existentes. A acompanhar o jantar ouvia-se fado e outros géneros de música em Português. Soube bem experimentar, tão longe de Portugal, sensações Portuguesas.

E como seria de esperar, não fosse sexta-feira à noite, fui dar um pézinho de dança na única e “espetacular” discoteca de Díli: “Casa Minha”. Fui com o Mário e novamente com a Lor e as meninas da outra casa. Voltámos para casa de Táxi, transporte que pensávamos inexistente àquelas horas e ainda ficámos com o contacto do taxista que nos pareceu boa pessoa e trabalha todos os fins de semana à noite!

Sábado foi um dia no mínimo entediante. Choveu o dia todo. Aqui quando chove, chove sem pudor. A chuva cai em quantidades exorbitantes e com uma força inimaginável. Resultado: não saímos de casa. Jogámos às cartas, mais uma etapa do nosso campeonato de sueca Italiano em que eu ocupo, orgulhosamente, a última posição. Li. Vi séries. Escrevi. Dormi.

Domingo foi manhã de praia. Fomos de bicicleta, demora-se cerca de 30 minutos a chegar à praia do Cristo Rei. São 30 minutos de paisagens admiráveis, dignas de postais. Atenção porque são também 30 minutos de exercício físico! 30 para lá, 30 para cá.
Esteve uma manhã óptima até que o tempo começou a ficar escuro e a chuva caiu repentinamente, como sempre. Chegámos a casa encharcados. Sabe bem andar à chuva de bicicleta!

A equipa MOVE iniciou uma operação que apelidamos de “operação vai tu”.  Consiste em ir até à praia do Cristo de Rei de bicicleta, parar por lá e fazer uns abdominais e flexões, dar um mergulho e regressar a casa. Parece bastante interessante até vos dizer as horas a que a operação “Vai tu” começa: 6h30/7h A.M. Eu preferia ao fim da tarde, mas nunca é certo que possamos, para além de que normalmente chove ao fim da tarde e é a altura mais propícia para os mosquitos atacarem.
Vou me mentalizar desta operação e tentar aderir ainda esta semana. Ontem e hoje foram o Xico e o Mário. “Vai tu, que eu já lá vou.”

Ontem, Segunda-Feira, tivemos uma reunião com o Padre Xico num café perto da Embaixada Portuguesa. O padre Xico é Italiano, viveu 40 anos no Brasil e está há 8 cá. Imaginem o sotaque dele. Este senhor vive em Ataúro, uma ilha perto de Díli, que é constituída maioritariamente por pescadores. O Padre Xico colabora com várias comunidades, é muito proactivo e é ele que vai escolher os 15 pescadores que vão assistir ao workshop que vamos dar esta Quinta-Feira no CJ.


Mais um dia a começar,
Boa Semana para todos,
Beijinhos, MM





Foto tirada pelo Mário em Railaco
Foto tirada pelo Mário em Railaco

segunda-feira, 5 de março de 2012

Cada vez gosto mais de Timor. 

Disse no post anterior que infelizmente a semana que passou ia ser uma semana de mudanças. Enganei-me redondamente. Foi sim uma semana de mudanças, felizmente!!
A casa anterior era realmente uma casa espetacular, penso que já a descrevi anteriormente: 2 andares, em cada andar uma cozinha e uma sala enorme, 3 quartos no R/C e 2 no andar de cima, quartos grandes. Jardim enorme, varanda gigante, terraço com chapéu de sol e cadeiras, segurança 24hrs, muros altos, 2 manas (empregadas), gerador de eletricidade, máquina de lavar a roupa,  grelhador, forno, água quente, e os luxos eram estes, sem nada a acrescentar.


Casa MOVE Timor
Passo a descrever esta casa que adoro. Um andar, uma salinha no hall de entrada, uma sala de estar com uma mesa redonda no meio, 3 quartos com WC dentro, uma “cozinha” (verão em breve a razão das aspas), e uma casa de banho na cozinha para a mana.
Ter uma mana aqui é bastante comum para os malai, não é muito caro e justifica bastante, visto termos o dia ocupado e na verdade uma boa limpeza faz a diferença quando falamos de bichos. Boa limpeza é coisa que a mana Nuni não faz, mas vai aprendendo devagar, a única velocidade que os Timorenses conhecem.
O Francisco e o Mário partilham um quarto; o Hugo e o Pedro outro e a menina cá de casa tem um quarto só para si! Cama de casal, e uma casa de banho um pouco diferente do que estamos habituados mas ainda assim melhor do que a da maioria dos Timorenses.
Não há forno. Não há água quente. Não há gerador. Não há máquina de lavar a roupa. Loiça idem.
Coisas básicas, aqui supérfluas.

Hall de Entrada/Garagem
Sala de estar
A bela da cozinha
Cozinha+buraco no tecto

Mangueira improvisada de maneira a não ter de tomar banho cada vez que lavo as mãos.
Chuveiro+balde (auxiliar de banho, devido à falta de pressão do chuveiro)
Para compensar isto tudo, que na verdade faz parte e eu acho que só assim é que faz sentido, estamos rodeados de pessoas aqui. A outra casa não nos permitia ter qualquer tipo de contacto com os vizinhos, já esta é impossível não ter. E ainda bem.
Somos os únicos malais do bairro, todos nos cumprimentam sempre: Boa tardi senyora! Ultimamente as crianças até dizem o meu nome!
Nas traseiras de nossa casa, onde a cozinha está e tem uma porta, temos vizinhos e este é o cenário.

Foto das traseiras tirada da Cozinha



Bakita e Paulo
Bakita e Paulo nas traseiras de casa
Nos primeiros dias ficámos um pouco surpreendidos com a facilidade com que nos entravam pessoas diferentes em casa. A empregada é família dos numerosos vizinhos que temos e então as crianças vinham agarradas à Nuni e passavam o dia em nossa casa. Entravam e diziam boa tardi e por lá ficavam um bocado até se irem embora e voltarem mais tarde. Agora acalmou e a Bakita é a única persistente. A Bakita é uma menina muito gira que vive nas traseiras desta casa e passa os dias aqui. Falar com ela é impossível, não só porque não falamos a mesma língua mas também porque ela não fala muito.

Durante o dia a porta da cozinha fica aberta, a Nuni está cá e os vizinhos são de confiança. Uma ida à cozinha significa um Boa tardi ao vizinho ou mais um esforço em vão para aprender tétum. Em vão pois já foram várias as vezes em que fui ter com a Nuni, durante as várias horas que ela passa sentada no degrau da cozinha, para treinar o meu tétum, mas de facto é impossível. Ela não fala Português, eu falo tanto Tétum como ela Português. Comunicar: missão impossível! Já pensámos em fazer uns desenhos com as tarefas diárias que ela deve fazer, coisas tão simples como: levar o lixo, varrer o chão e não apenas o espaço do chão à vista. Mesmo que tentemos falar tétum ela não nos entende.
Ainda tenho esperança.


3 meninas que vivem à frente de casa 
Nos primeiros dias sem carro percebemos que tínhamos de comprar uma bicicleta, caso contrario íamos gastar muito dinheiro em táxis e Díli é grande o suficiente e faz calor mais do que suficiente para o táxi ser uma alternativa.
Ontem foi dia de comprar as bicicletas. Esta ideia sempre me “assustou” um bocado, o trânsito é caótico, muitas motas, não há regras de ultrapassagem e é raro o semáforo. Se me assustava antes de andar de bicicleta não queiram imaginar agora! Ontem foi só o primeiro dia em que andámos por Díli de bike e já senti algum pânico. Talvez esteja a exagerar um bocado. Isto para os meninos é “peanuts”, andam a 100km/h e deixam-me para trás como se não lá estivesse!! Algum treino e acho que brevemente começará a ser um prazer em vez de um pânico constante!

Esta Sexta-Feira não fomos sair, eu também estava a sofrer um bocado as consequências intestinais de estar num pais destes. E por isso Sábado acordei cedo para poder “skypar” com a mana Margarida, coisa que não aconteceu pois acordei “às escuras”. Estive em casa sem eletricidade durante cerca de 3 horas. Os meninos tinham ido ver o Benfica perder à casa antiga, que tem TV e gerador.
Aproveitei para esgotar a bateria do PC e ver séries e “falar” um bocado com a Nuni e com os vizinhos.
À tarde fomos à praia da areia branca. Alguém nomeou esta praia como “o Algarve de Dili”, é para onde os estrangeiros como nós vão e há cafézinhos que levam água de coco e todo um menu extenso à mesa. É também o sítio priviligiado de Dili para ver o pôr-do-sol.




Sábado à noite fomos jantar com a Inês que morava na antiga casa connosco, com a Lor, a francesa que vive com elas agora e com o Hayden, um rapaz Australiano muito simpático. Depois fomos sair para o Girasol, passo a mostrar a única foto aceitável da noite!


No final da noite fui de mota com o Hayden para casa! BRUTAL andar de mota aqui, sente-se o vento quente e vê-se a vida Timorense como se fosse um filme. Já estava o sol a nascer . Passámos pelo Mercado de Taibéssi, o maior Mercado de Dili e os vendedores já montavam as bancas, e olhavam para os 2 malais que aquelas horas estranhas passavam por ali.

No dia seguinte, no chamado dia de ressaca, adivinhem só onde fui parar. Luta de galos! Comecei bem o dia a ver galos à luta num quase ringue de box, com centenas de pessoas à volta a fazer apostas. É comum fazer-se aqui este tipo de crueldades, não sou a favor mas não pude perder o espetáculo que por acaso, acontece todos os dias. As galinhas lutam com uma lamina nos pés e então vemos algumas a ficarem sem patas, outras a escorrer sangue de qualquer sitio onde tenham levado uma “patada”.. é um bocado chocante, não só por ser novidade como também por todo o culto a uma tradição que vai contra o direito destes animais.
Neste “espetáculo” eram só homens e eu. Quando cheguei perguntei-me e perguntei se era permitido eu lá estar, uns disseram que não, outros que sim..no fim entendi que podia ficar por ser malai. Não me senti muito confortável mas tinha dois guarda-costas a protegerem-me de qualquer incidente que pudesse acontecer, o Mário e o Xico.
Deixo-vos um video de uma luta:






Uma coisa que como muito aqui e em Portugal é preciso lembrar-me que faz bem para comer: fruta! Maracujá, Goiaba, banana, ananás, melancia, anonas, manga…uma infinidade de frutos ao preço da chuva! Este fim-de-semana deliciei-me com maracujás!!


Passando a outro tema, qual é o nosso espanto quando o Francisco este fim-de-semana recebe uma mensagem do "Embaixador" a convidar para um pequeno-almoço na sua residência. Claro que achámos que era mentira, pensámos que seria alguém a meter-se connosco, pois qual seria a probabilidade de sermos convidados pelo Sr.Embaixador para um pequeno-almoço. Pois bem, combinámos hoje pelas 8h na residência e afinal sempre era verdade! O Embaixador queria conhecer o projeto MOVE, conhecer a equipa e para além disso ainda se mostrou muito disponível para ajudar, fornecendo-nos contactos que vãos ser muito úteis para o sucesso do nosso trabalho. Alguma formalidade e um pequeno-almoço com muita fruta e várias manas a servirem.
Como voluntários que somos, pedimos boleia para casa depois do pequeno-almoço. Conseguem ter mais ou menos ideia do cenário. O cenário era o seguinte: carrinha de caixa aberta,  nós vestidos com roupa formal e porque os Timorenses não estão habituados a ver malais "nestas condições", alguns olhos postos sobre nós! No final demos 1 Dólar ao senhor da carrinha e ele ficou todo contente.





 E parece que vem aí uma semana cheia de trabalho! 


Beijinhos para todos,
MM